sexta-feira, 13 de maio de 2016

O que a Sociologia tem a dizer sobre o Secretariado Executivo?


 Fonte:http://professor-e-filosofo-michel-gustavo.blogspot.com.br/
                                           

O Que a Sociologia Tem a Dizer Sobre o Secretariado Executivo?



Gênero e a Profissão de Secretário Executivo


*Ivan Penteado Dourado


Um dos pontos mais discutidos atualmente nas profissões é a origem moderna destas. Podemos recordar o mundo antigo e identificar os primeiros profissionais que lembram nossa profissão, porém, isso pode esconder os processos ocorridos com o advento da modernidade. Ser um profissional que presta assessoria para outros profissionais de maior status ou mesmo superiores na hierarquia de comando ou no patamar salarial apresentam particularidades históricas marcadas, entre outras questões, pelo gênero. Podemos pegar os profissionais de limpeza, os técnicos em enfermagem, os enfermeiros (coloquei no masculino, exatamente para mostrar que normalmente estas profissões são colocadas no feminino, e coincidentemente ou não, são ocupados hegemonicamente por mulheres).

Essa discussão está presente em diferentes profissões, na formação superior em Secretariado Executivo isso não é diferente. Chamar a profissão no feminino revela uma concepção socialmente compartilhada de secretariar, como função “de mulher”, o que na sociologia chamamos de senso comum ou entendimento compartilhado sem reflexão. Ou seja, como vejo só mulheres realizando essa atividade, ela se torna uma profissão feminina. Mas isso não explica profundamente esse processo, ou seja, o que leva as mulheres a optarem por profissões consideradas “femininas”?

Se resgatarmos as profissões entendidas nesta perspectiva, é possível identificar que muitas delas são desdobramentos de funções que a mulher já desempenhava “no lar”. Limpar a casa, cuidar dos filhos e dos enfermos, organizar os compromissos do marido e etc. Essa função feminina não é natural, ela é socialmente construída, em grande medida pela educação doméstica que passa de pai para filho, mãe para filha e são mantidas dentro do lar. Assim, as lógicas de gênero que o formaram (ou seja, reprodução de comportamentos aceitos pela sociedade), definem a forma de pensar e agir posteriormente na escola e na sociedade.  

Mesmo após as vitórias dos movimentos feministas e a abertura do mercado de trabalho para o ingresso massivo de mulheres, essa “educação doméstica” tende a reproduzir essas “aptidões aprendidas em casa” refletindo nas suas escolhas profissionais futuras. Sociologicamente não estamos dizendo que: “toda a mulher será assim”, mas estamos identificando o peso que essa educação familiar tem na escolha futura da sua profissão. No caso das secretárias (sem ensino superior, de formação técnica ou mesmo sem formação para tal), é muitas vezes entendida como um mero acessório feminino para uma maioria de empresários homens, gerentes e doutores, que contratam mulheres para controlar agenda, receber pessoas, atender telefone e na organização de documentos. Essa visão de senso comum que coloca a mulher (em sua profissão), como mero apêndice técnico dos homens, fazem de suas profissões algo menor e inferior, de fácil substituição, por esses e outros motivos são colocados direto no feminino (exemplo, as secretárias). Uma ótima dica ilustrativa que lida indiretamente com esse tema e de sucesso mundial é a série de televisão chamada Mad Man.  

No caso do Secretariado Executivo, um curso de nível superior que forma secretárias para funções muito além de ações técnicas, demandando destes profissionais uma formação acadêmica em gestão de processos, necessitando dominar no mínimo duas ou mais línguas estrangeiras, com perfil profissional diferenciado e pró-ativo, dentro e fora do espaço universitário. Porém, fora do seu curso e do convívio com seus pares, este profissional terá grande chance de ser confundido com a profissão técnica de secretária. Isso se reflete na própria definição socialmente compartilhada de senso comum referente à profissão, tende a carregar por muitos anos ainda, o entendimento de que secretário executivo e secretário técnico não diferem na prática (sendo chamada de secretária executiva, mesmo que tenham homens que busquem essa formação).

Se o desejo destes profissionais é romper com esses princípios preconceituosos e machistas de senso comum em sua profissão, não bastará proibir o profissional de escrever e se apresentar como secretária executiva, ou mesmo constatar o problema e reclamar “que a sociedade é assim”. É necessário que este profissional, entenda sociologicamente a construção social do machismo e do preconceito, que existe dentro e fora do espaço universitário, dentro e fora das empresas. Ou seja, o profissional precisará ser mais que um bom profissional, precisará sair da universidade com uma formação universal, compreendendo que sua profissão está inscrita em uma realidade desigual no que diz respeito ao gênero em uma sociedade machista e a profissão, em uma sociedade hierárquica. Ser secretário executivo no Brasil hoje demanda um duplo papel, político e organizacional. O primeiro firmando um compromisso ético de superação do machismo e do preconceito, sem com isso, perder de vista seu papel na imprescindível estrutura organizacional das empresas e organizações modernas.      




*Ivan Penteado Dourado
Professor de Sociologia – UPF
Mestre em Ciências Sociais
Doutorando em Educação
Perfil no facebook: https://goo.gl/RGKlxS

Um comentário:

  1. Interessante ver e discutir, no âmbito do secretariado, a questão de gênero e as atribuições socialmente construídas no perfil feminino - maioria em nossa área - e na profissão de secretários/as.
    Partindo de uma concepção de construção social do perfil profissional, é possível perceber que as influências de uma sociedade machista e heteronormativa fazem parte do nosso cotidiano pessoal e profissional.
    Dessa forma, entender nossa profissão, conforme dito pelo autor do texto, passa antes por entender as bases da nossa sociedade.
    E essa discussão ainda é incipiente dentro dos espaços de formação acadêmica e profissional do secretariado, mais um sinal de que as heranças sociais da profissão permanecem influenciando a atuação de secretários e secretárias e a percepção da sociedade sobre eles/as.

    Rodrigo Müller.
    Curitiba, PR.

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